quinta-feira, 21 de junho de 2012

Seres Humanos Digitalizados Tornamos-nos, definitivamente, virtuais...


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Revista Veja - Participar de um projeto como o MyLifeBits mudou a vida do senhor?
Gordon Bell - Eu me tornei portátil. Estou livre de pilhas e pilhas de papéis. Toda a minha vida está arquivada num disco rígido. Ela ocupa 260 gigabytes. Posso, por exemplo, trabalhar em qualquer lugar do mundo, contanto que esteja com meu computador por perto. Ter tudo digitalizado também me deixa bastante seguro. Em certo sentido, tenho uma sensação de imortalidade. Aliás, no futuro, nossas memórias digitais poderão ser transformadas em avatares. Eles conversarão com nossos descendentes. Uma das consequências da memória total é que deixaremos uma história incrivelmente mais rica para a posteridade. (Depoimento de Gordon Bell, cientista americano, responsável em parceria com Jim Gemmell, pelo projeto MyLifeBits, da Microsoft Research, e co-autor do livro Total Recall - Memória Total)
O entusiasmo de Bell, aos 75 anos, com as possibilidades legadas pelas novas tecnologias é contagiante. A leitura destas linhas e de toda a entrevista feita com ele e com seu parceiro de pesquisa, Jim Gemmell, traça as linhas daquilo que se prenuncia não como um futuro distante, mas como algo que já está acontecendo e que irá ser ampliado para toda a humanidade como possibilidade real de serviços.
Mas olhemos com atenção alguns trechos de seu depoimento contidos na pergunta acima destacada:
Ao afirmar que se tornou "portátil", há uma vinculação direta e aparentemente total entre homem e máquina, como se fôssemos um ser composto e, de certa forma, indissolúvel, a partir de agora, pois na continuação de sua fala, Bell menciona que esta condição (portátil) está vinculada à posse de seu computador, fiel escudeiro, sempre por perto... É claro que isto é um exagero, ainda mais em se tratando de um cientista de ponta, responsável por um projeto bancado pela Microsoft, mas por trás desta colocação, é possível prever (até mesmo com base no que já vemos em nosso cotidiano) como realmente estamos ficando techaddicts (não sei se a expressão existe, mas seria uma espécie de "viciados em computador", traçando um paralelo com drugaddicts, viciados em drogas).
Ao dar números à sua vida, estipulando que ela hoje representa 260 gigabytes, com base em todos os registros feitos por ele dentro da pesquisa MyLifeBits, através da qual sua vida está sendo constantemente filmada e gravada em bits, além de todos os demais registros possíveis (fotos, escritos, falas...), Bell realiza o sonho da ciência, de metrificar, quantificar e, eventualmente, pesar, avaliar e ponderar o próprio ser humano...
Com tantas câmeras e recursos digitais ao nosso redor, ainda que a partir de certo momento de nossas vidas venhamos a esquecer todo este monitoramento, que garantia temos quanto à nossa privacidade e espontaneidade? Quanto a isto, em outro momento da entrevista, Bell afirma que pode ser benéfico, pois nos fará sempre escolher os melhores e mais éticos caminhos quanto ao que fazemos de nossas vidas... Errar deixa então de ser uma possibilidade? Que futuro estamos legando às novas gerações se as atrelamos a sistemas que não lhes permitirão nem sequer cometer falhas?
A questão da aparente "imortalidade" remonta também a sonhos e ideais da ciência desde tempos imemoriais. Indo um pouco além, com tanto registro, dados abundantes, informações a bel prazer, que esforço real nossa mente, o maior de todos os supercomputadores como já tive a oportunidade de registrar neste espaço virtual, terá que fazer? Que estímulos quanto à memória e ao desenvolvimento do raciocínio e da criatividade existirão para os seres humanos a partir de agora?
E outra: todos seremos então imortais a partir do registro de nossas existências, o que me parece bastante belo e democrático... No entanto, vale refletir sobre se queremos isto e, ainda, que valor real existirá para a humanidade o conhecimento de todas estas experiências individuais...
Escrevendo estas linhas, concluo que a ficção está morrendo e sendo substituída pela realidade ou, melhor dizendo, pela virtualidade... Lembrei-me de filmes como Substitutos, 1984, Matrix, Admirável Mundo Novo e Violação de Privacidade (The Final Cut, 2004)... Neste último, com chips implantados em nossos cérebros, o registro de tudo aquilo que ocorre em nossas vidas é armazenado automaticamente em computadores "linkados" a este chip, reproduzindo a ideia do projeto MyLifeBits e do livro Total Recall (cujo título também remonta à ficção científica, pois há um filme estrelado por Arnold Schwarzenneger, baseado em obra de Phillip K. Dick, de mesmo nome).
O futuro é promissor? Ou assustador? O que nos reserva o amanhã?

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